quarta-feira, março 05, 2014

Edição Extraordinária

Cadeirantes discriminados/segregados no Gigante da Beira Rio



No dia 17 de fevereiro o Movimento das Pessoas com Deficiência (PCDs) realizou vistoria no Estádio Beira Rio. A decepção foi muito grande. Houve a visualização, “in loco”, de tudo que se denunciara há mais de 10 meses à Diretoria do Clube do Povo. O “projeto” elaborado pela construtora e aprovado pelo Internacional contempla um único local reservado, no nível mais baixo das arquibancadas inferiores, localizado a partir da linha de escanteio para trás das goleiras - sujeito a chuvas e intempéries. Os cadeirantes, em tal reservado, ficam isolados e segregados do restante do público. O local é tão indigno que recebeu, na ocasião, a pecha de “Chiqueirinho dos Cadeirantes”. 



No 2º jogo teste realizado na noite da quarta-feira, dia 26 de fevereiro, tivemos a comprovação de que o dito reservado, de fato, é um “Chiqueiro para cadeirantes”. Pessoas com Deficiência foram ao Estádio e tiveram de se sujeitar a (tentar) assistir ao jogo debaixo de guarda chuvas; pior, constataram que a visibilidade do local é péssima, inclusive com pontos cegos. Segundo matéria do Jornal Zero Hora, publicada na página 49 da edição do dia 27 de fevereiro: “para quem senta nas primeiras fileiras, as placas de publicidade tapam quase metade da goleira”. Fotos ilustram a reportagem. 

Em que pese tenha reconhecido as falhas do projeto e se comprometido a solucionar os problemas, nos inquéritos que tramitam junto ao Ministério Público, o Sport Club Internacional, através de seu Vice Presidente de Administração, José Amarante, disse, no último encontro com o Movimento das PCDs, que, até o final da Copa do Mundo, o Clube não tomará qualquer tipo de atitude para resolver a questão. Para piorar o quadro, um diretor do Internacional declarou em entrevista à Rádio Gaúcha, ao final da partida do dia 26 de fevereiro, que o local reservado para cadeirantes do Beira Rio é nobre e se constitui no melhor espaço dentre os estádios brasileiros.

A direção do Internacional adota, pois, criticável proceder. Internamente desrespeita o Movimento das PCDs e externamente busca através de pronunciamentos midiáticos transparecer uma situação de normalidade. 

O fato é que chegamos ao marco de 100 dias para Copa do Mundo. E a situação é a mesma denunciada à diretoria do Clube há mais de 10 meses. 

É dizer: a diretoria do Clube, literalmente, colocou as PCDs para linha de escanteio, tratando-as como cidadãos de segunda categoria. E isso justo numa instituição que possui a alcunha de Clube do Povo e que tem como símbolo maior o personagem Saci Pererê. Profundamente lamentável!

Entenda melhor o caso 

Há mais de 10 meses a Associação RS Paradesporto, ao lado de outras valorosas entidades do Movimento das Pessoas com Deficiência (PCDs), gestiona em inquéritos que tramitam perante os Ministérios Públicos do Rio Grande do Sul e Federal condições dignas de acessibilidade às pessoas com deficiência no Estádio Beira Rio. Foram diversas reuniões e encontros, sempre com a presença dos representantes do Internacional.

Todavia, a direção do Clube não fez nada concreto para alterar o quadro. Pelo contrário, após estabelecermos condições para assinatura de um TAC (termo de ajustamento e conduta) recuou e negou-se a assinar o documento.

Reza o artigo 23 do Decreto n. 5296: "Art. 23. Os teatros, cinemas, auditórios, estádios, ginásios de esporte, casas de espetáculos, salas de conferências e similares reservarão, pelo menos, dois por cento da lotação do estabelecimento para pessoas em cadeira de rodas, distribuídos pelo recinto em locais diversos, de boa visibilidade, próximos aos corredores, devidamente sinalizados, evitando-se áreas segregadas de público e a obstrução das saídas, em conformidade com as normas técnicas de acessibilidade da ABNT."

O quantitativo não é o dado mais importante da lei. Deve-se considerar o que diz a lei quanto a "distribuidos pelo recinto em locais diversos" e "evitando-se áreas segregadas". É isso que o Movimento das PCDs defende e pleiteia. A luta é contra a segregação. Pela distribuição dos lugares em locais diversos. Não se quer segregação de idosos, nem crianças, nem ninguém segregado do restante do público.

Importante alertar, já que estamos na iminência da realização da Copa do Mundo em nosso Estádio, que a própria FIFA reprime o procedimento adotado pelo Internacional. Consta no item 6 do Caderno de Encargos da FIFA (p. 123) que deve ser disponibilizado uma variedade de categorias de posições de assentos e opções de ingressos, de forma a oferecer ao portador de necessidades especiais as mesmas oportunidades oferecidas aos espectadores que não sejam portadores de necessidades especiais e que os portadores de deficiência devem ser protegidos contras intempéries. A prática costumeira de oferecer espaço na área de aberta próxima ao gramado não é admissível.

Registre-se que o “projeto” levado a cabo no Beira Rio efetivou justamente o que o caderno de encargos da FIFA veda, de forma peremptória. Oferecer espaços na área aberta próxima ao gramado não é admissível, diz o documento da FIFA.

A atual concepção de Beira Rio é segregacionista. Estamos (PCDs) confinados a uma única área. E para piorar, essa única área é de péssima localização, no nível mais baixo de visibilidade, atrás das goleiras e sujeita a todas as intempéries.

É contra isso que lutamos. Não se busca privilégios ou favores. Queremos estar com condição de igualdade e dignidade dentro do Estádio Beira Rio. Queremos exercer o direito e ir ao jogo junto com nossos amigos e familiares e assistir a partida ao lado deles. Queremos exercer o direito de escolher o local aonde vamos assistir ao jogo, pagando por isso, como todo torcedor do Internacional. 

Como dito, a própria direção do Internacional já reconheceu as mazelas do projeto. Mas, durante a vistoria realizada ao Estádio, deixou claro que nada fará até o final da Copa do Mundo. É contra esse contexto que lutamos, porque não podemos compactuar nem com posturas e procedimentos e muito menos com uma sociedade segregacionista e discriminatória.


Saudações rubras, do CAMPEÃO DE TUDO, DONO DA ALDEIA (42*) e SEMPRE NA PRIMEIRA DIVISÃO. 

Luiz Portinho - mais de 750 jogos no Gigante da Beira Rio 
lcportinho@yahoo.com.br 
@lcportinho